domingo, 9 de agosto de 2009

Doces deletérios

Ele a encara. Respira fundo duas vezes. É um momento difícil para ambos.

- E então? É tudo o que tem a me dizer?

- Não, não é. Eu gostaria de dizer que você é um estúpido, e talvez esta estupidez tenha feito com que eu estivesse com você por tanto tempo. Que você, quando me apressava pra sair, me fazia ficar louca de raiva. Mas, quando você me via pronta e dava aquele sorriso malicioso de canto de boca, eu me sentia a mais bonita das mulheres. Que você à noite ronca, mas é o som mais delicioso de se ouvir. Que você desmarca um jantar que nós esperávamos por semanas em cima da hora, pra na manhã seguinte, me acordar com um café da manhã na cama. Que você conta as piadas mais sem-graça, adaptadas aos contextos mais impróprios, me fazendo rir involuntariamente. Que você dá o fora quando vê que eu tô de TPM, mas volta uma hora depois com duas caixas de chocolate. Que você dorme quando a gente assiste uma comédia-romântica, mas com os seus braços me segurando forte. Que você nunca lembra de abaixar a tampa do vaso, mas sempre ouve a minha reclamação, sem responder. Que você briga comigo e, quando me vê chorar, me abraça e diz que foi da boca pra fora. E isso me faz querer te matar e, depois, te beijar até o dia raiar. Que você diz que fui eu que arranhei o carro, diz que eu não tenho cuidado e completa depois com uma risada infantil que a culpa pela torradeira ter queimado é sua. Que, quando você apressado de manhã eu tenho vontade de dizer que você leva um pedaço meu, que só volta à noite, na hora que você chega. Que você, agora, não deve tá nem escutando o que eu digo. Que, quando você sair daqui hoje, vai se sentir arrependido, mas, por orgulho, não vai pedir pra voltar. Que, se isso acontecer, eu vou primeiro me sentir feliz por ter terminado algo aparentemente sem futuro, depois vou chorar duas semanas inteiras e depois, me jogar no primeiro filho da puta que aparecer. Que, no futuro, nós vamos nos encontrar e vai ter aquele silêncio incômodo, de não saber o que falar um pro outro. Que eu vou ter vontade de dizer que eu não queria ter terminado tudo tão cedo, mas vou ficar calada. Que você vai querer dizer que as coisas poderiam ter sido diferentes, mas vai preferir falar do seu novo emprego. Que nós seremos duas pessoas sem direção. Que você, agora, vai embora. Que eu vou ficar te olhando ir. Que, depois, vou correr até o fim da rua, em vão. Porque o carro já vai ter ido embora.

Dez meses depois, eles continuavam brigando; desta vez, porém, era para decidir quem levantaria para ver o porquê do filho estar chorando.

13 comentários:

  1. Que deslumbre, Sam.
    Imaginei um final menos feliz, por isso me surpreendi.
    Imaginei ser o fim, mas, foi tudo uma linda declaração de amor, amor louco, amor terno, amor passional..

    Lindo mesmo!
    beijos.

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  2. É a primeira vez que passo por aqui e confesso que gostei viu.

    Vou te linkar as meus favoritos.


    abraços

    Hugo de Oliveira

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  3. coitado do filho, vai chora ali por horas ainda hihihi

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  4. Nossa, que surpresa! Jurava que tudo terminaria como essas cenas de filme em que depois da briga e da separação acontece uma série de encontros e desencontros. Mas o final que você deu foi surpreendente. Amei.

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  5. Simplesmente lindo, talvez palavras não esclareçam o que sentimos ao ler algo assim.
    Muito bom! :*

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  6. Pois é Bertolie, legal vc conhecer a muitos anos aquele site... Pra vc ver, eu não conheço tudo ainda aqui na internet hehehehe

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  7. Own meu deusi que coisa liiinda!! Eu ja tava quase chorando sabendo exatamente como é esse encontro, vários encontros, incomodos, de silencios estranhos...
    Ah, eu tambem quero um filhinho, daqui a dez meses. tá, mentira, eu tenho 17 anos e nao sou louca. Tá, eu tenh 17 anos e su louca, e ficaria feliz em brigar pra ver quem vai ver o bebe, sim :B

    AUHSUHAUSH

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  8. Quando se está a ponto de perder alguém passa um filme na nossa cabeça e fazemos as declarações mais sinceras e lindas que poderíamos fazer... Relacionamentos modernos são assim: "Jamais espere ouvir "eu te amo" num jantar à luz de velas, no dia dos namorados. O amor odeia clichês. Você vai ouvir "eu te amo" numa terça-feira, às quatro da tarde... depois de uma discussão..." (Impontualidade do amor - Martha Medeiros)

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  9. Adorei o texto, Sam! Acho que se todas as pessoas pensassem nas consequências de seus atos, mesmo dessa maneira meio hilária, o mundo seria mais leve e ninguém teria tantos arrependimentos.
    Quanto tiver tempo passarei no teu blog particular. Seus textos devem ser bons que nem os daqui, neah?
    Adoro isso aqui. Parabéns pra ti e pro palhaço {no bom sentido} do Bertonie.
    Beijos pra vocês :**

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  10. Ahh, que ousadia para o final .
    Me surpreendi pelo final, como quase todo mundo que leu.
    um amor absoluto, que entende e compreende que não se é por completo, se o outro não estiver por perto .

    amei!

    ;*

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  11. Bom, gostaria de comentar algo diferente, como esperava algo assim, ou qlqr coisa do genero... MASSS, cai q nem patinho =p haha, o final é realmente excelente! Parabens, e como já tinha prometido, continuarei vindo aki! =D

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  12. nossa, esse final ficou simplesmente perfeito! eu jurava que ia ser totalmente diferente. gostei bastante daqui ;)

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  13. Adorei!
    O parágrafo grande poderia ser tb "o q a maioria das mulheres quer dizer para o seu homem" rs.
    E o final...é, bem real!
    Bjos,
    Paulinha

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Caso o hóspede não aproveitou dos serviços desse hotel, a equipe do Hotel de Papelão acha melhor não usufruir dos meios de comunicação aqui presentes. Atenciosamente, Bertonie e Sam.
Resumindo: não leu, dá meia-volta e abraça a pessoa mais próxima. Mas não comenta. Beijo, nos liguem.